- setembro 11, 2023
Plantio direto a lanço acelera a recuperação de pastagens degradadas
O plantio direto com semeadura a lanço possibilita recuperar a capacidade produtiva de pastagens degradadas com maior agilidade e menores custos. Na foto, pasto com capim Zuri
|
Pesquisas realizadas pela Embrapa com produtores do Acre apontam que o plantio direto com semeadura a lanço possibilita recuperar a capacidade produtiva de pastagens degradadas com maior agilidade, menor investimento financeiro e sustentabilidade. Além de reduzir pela metade o tempo para formação e estabelecimento da pastagem, essa modalidade de plantio proporciona economia de até 15% no custo do processo de reforma e diminui os impactos ambientais da atividade pecuária.
A Embrapa Acre estuda o plantio direto de forrageiras desde 2011, com o objetivo de disponibilizar alternativas sustentáveis para a reforma de pastagens, em substituição ao método mecanizado. A modalidade a lanço foi testada e recomendada para o capim-xaraés (também conhecido como capim-MG5) e piatã, únicas cultivares de Brachiaria brizantha recomendadas para o Acre.
Segundo o pesquisador Carlos Maurício Andrade, responsável pelos estudos, mais de 80% das propriedades rurais acreanas apresentam solos com baixa permeabilidade, sujeitos ao encharcamento durante a estação chuvosa. O capim-xaraés é a cultivar mais plantada atualmente no Acre, por sua alta produtividade e boa tolerância ao encharcamento do solo. Já o capim-piatã é recomendado para áreas menos sujeitas ao encharcamento do solo. Em muitas localidades, a combinação de solos encharcados com relevo acidentado aumenta o risco de erosão e dificulta o uso de mecanização na renovação de pastagens.
“O plantio direto a lanço é eficaz para reformar pastagens degradadas, sem exposição do solo a processos erosivos. A reforma com uso da técnica, desde os cuidados iniciais com a área até o primeiro pastejo, leva de 90 a 100 dias, enquanto no método convencional pode durar até 150 dias. Além de encurtar o tempo que a pastagem permanece sem uso durante a reforma e reduzir custos para o produtor, o plantio direto a lanço contribui para a manutenção da rentabilidade do sistema produtivo e pode ajudar a desenvolver a pecuária a pasto na Amazônia, com sustentabilidade”, ressalta o especialista.
Passo a passo para implantaçãoA adoção do plantio direto a lanço deve ser planejada e cada etapa (gerencial ou de campo) executada no tempo adequado, conforme orientações da pesquisa. Em reformas realizadas com recursos próprios, o planejamento deve começar seis meses antes do plantio da forrageira. Em processos financiados, a antecedência é de um ano. Esse cuidado facilita a aquisição prévia de sementes, adubos e outros insumos necessários. De acordo com Andrade, um dos principais passos para a implantação da técnica é dessecar toda a vegetação existente na pastagem, com herbicida glifosato, procedimento que substitui o preparo mecanizado do solo. “É necessário um manejo prévio à dessecação, para diminuir o volume de palhada. O pasto deve ser mantido sob pastejo durante a estação seca (até meados de setembro) e vedado por 15 a 20 dias. Essa prática possibilita a renovação de folhas verdes, processo que favorece a absorção do herbicida”, explica. Os estudos também mostraram que a dessecação sequencial, com duas aplicações de herbicida, é mais vantajosa do que a dessecação única, utilizada na agricultura. A estratégia aumenta a eficiência no controle de plantas daninhas e reduz o volume de palhada, essencial para facilitar a semeadura e a germinação das sementes de capim. No Acre, a primeira dessecação é recomendada para começo de outubro, quando iniciam as chuvas, com repetição do procedimento após 25 a 30 dias, com dose reduzida do herbicida. A semeadura do capim é realizada sete dias após a segunda dessecação (em meados de novembro). Para os capins xaraés e piatã, a pesquisa recomenda o uso de 20 a 25 quilos de sementes por hectare, taxa de semeadura que possibilita níveis satisfatórios de germinação e assegura a formação de um pasto denso e produtivo. Entretanto, investir em sementes de qualidade é fundamental para garantir eficiência ao plantio direto a lanço e evitar prejuízos. Outra recomendação é fazer a adubação da área reformada com base nos resultados das análises do solo, no momento da semeadura ou logo depois dessa etapa. É indispensável, ainda, realizar o controle de plantas daninhas, 30 dias após o plantio, e aguardar o tempo necessário para o primeiro pastejo. Acesse a publicação Plantio direto a lanço dos capins Xaraés e Piatã no Acre e saiba mais sobre o passo a passo da técnica.
Foto acima: Carlos Maurício Andrade (pastagem com capins Xaraés e Piatã após 90 dias de semeadura) |
Pastagens duradouras
A degradação de pastagens prejudica a produtividade de forragem e reduz o desempenho do rebanho, com prejuízos para os produtores rurais e para o meio ambiente. Segundo dados do MapBiomas Brasil, plataforma que reúne informações sobre a cobertura e uso da terra no País, somente na Amazônia existem 55 milhões de hectares de pastagens, dos quais 57% apresentam degradação moderada a severa.
No Acre, aproximadamente 479 mil hectares de pastagens estão nessa situação. O problema tem como causa principal a Síndrome da Morte do Braquiarão (SMB), doença decorrente do encharcamento do solo. O plantio direto de forrageiras a lanço tem contribuído para a recuperação dessas áreas.
Há seis anos, o pecuarista Fábio Medeiros trocou o método convencional pelo plantio direto a lanço na reforma de pastagens das fazendas Filipinas, localizada no município de Xapuri, e São Joaquim, em Brasiléia, região do Alto Acre. Ele iniciou com 100 hectares e, atualmente, são 6.400 hectares reformados com a técnica (74% das pastagens das propriedades).
“Nossa pastagem era toda formada com capim braquiarão e estava muito degradada, mas como temos um relevo acidentado, a reforma com mecanização deixava o solo mais vulnerável à erosão. Com o plantio direto a lanço, diversificamos as pastagens com variedades de forrageiras adequadas para os solos da região e isso resultou em pastos mais eficientes e aumentou a taxa de lotação das pastagens de 1,4 para 2,4 Unidades Animal (UA) por hectare. Hoje, gastamos apenas com a manutenção das áreas reformadas e temos a tranquilidade de contar com pastagens produtivas e duradouras, sem danos ambientais”, ressalta Medeiros.
Na propriedade de Francisco Ernandis, em Rio Branco, o plantio direto a lanço foi utilizado pela primeira vez em 2019, na reforma de 20 hectares de pastagem. A técnica já foi aplicada em 370 hectares e, este ano, serão reformados mais 60 hectares. Segundo o produtor, além do relevo acidentado, os solos da Fazenda Transacreana apresentam alto grau de encharcamento. Para solucionar o problema, investiu no plantio de gramíneas resistentes, recomendadas pela pesquisa.
“Utilizamos o capim-xaraés na formação inicial da pastagem e, depois, plantamos a grama-estrela-roxa e o capim-humidícola nas áreas que ficaram descobertas. Com uma dessecação eficiente, conseguimos diminuir a competição de plantas invasoras no estabelecimento da pastagem e reduzimos gastos com controle químico. Economizamos na reforma do pasto e o meio ambiente também se beneficia”, enfatiza o produtor, que tem como meta ampliar para 2 mil hectares a área reformada com plantio direto a lanço.
Foto acima: Carlos Maurício Andrade (pasto reformado com capim Xaraés)
Vantagens da técnicaEstudos de impacto revelam que 95% dos pecuaristas que adotam o plantio direto de forrageiras no Acre realizam a semeadura a lanço. Embora demande maior quantidade de sementes, a técnica proporciona melhor rendimento operacional em relação a outras modalidades de plantio direto e ao plantio convencional. “A economia com horas e máquinas, possibilitada pelo baixo investimento em operações mecanizadas, compensa os gastos com insumos e reduz o custo total da reforma da pastagem. No Acre, um hectare reformado pelo método convencional custa dois mil e trezentos reais, enquanto no plantio direto a lanço o valor cai para dois mil reais”, avalia Andrade. Os benefícios da semeadura a lanço chamaram a atenção do produtor Edilson Alves de Araújo, que buscava alternativas mais eficientes para recuperar a produtividade das pastagens na Fazenda Bom Sucesso, localizada no município de Porto Acre. A propriedade tem solos planos e não enfrenta problemas de encharcamento, mas boa parte dos 800 hectares de pastagem existentes apresenta alto grau de degradação. “Testamos o plantio direto a lanço entre 2020 e 2021 e comprovamos que o seu custo benefício é excelente. Este ano, iniciamos a reforma de 100 hectares de pastagem e vamos continuar com a técnica. Poder colocar o gado mais cedo no pasto evita gastos com suplementação na dieta animal”, afirma. Além de ganhos econômicos, a semeadura a lanço, direto na palha, proporciona benefícios ambientais. A redução em 74% de processos mecanizados na reforma de pastagens minimiza o revolvimento do solo e protege esse recurso natural da erosão. Outro benefício é a incorporação de matéria orgânica (palhada) no solo, procedimento que melhora a atividade biológica e a fertilidade das áreas reformadas. A palhada que fica na superfície também ajuda a reter umidade no solo, favorecendo o desenvolvimento das plantas e o aumento da sua resistência a eventuais veranicos. O plantio direto está entre as práticas de produção sustentável incentivadas pelo Plano Setorial de Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária (ABC+), política pública que atua para o cumprimento de compromissos voluntários do Brasil para redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) no País. A meta é reduzir em 1,1 bilhão de toneladas as emissões de carbono equivalente no setor agropecuário, até 2030. O plantio direto a lanço reduz a queima de combustíveis fósseis, em função do baixo uso de mecanização, e evita outros processos emissores de carbono (CO2) para a atmosfera, como a decomposição da matéria orgânica no solo.
Foto acima: Carlos Maurício Andrade (capim Zuri emergindo) |
Foto acima: Carlos Maurício Andrade (pastagem com capim Zuri)
Protocolo para diferentes forrageiras
O plantio direto é uma técnica conservacionista bastante utilizada na agricultura brasileira, especialmente nos sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), mas ainda era pouco adotada na renovação de pastagens. Para ampliar o seu uso no Acre, na última década, a Embrapa, em parceria com pecuaristas, desenvolveu também modalidades de plantio direto em linha e em covas. Devido às facilidades para adoção, vantagens proporcionadas e possibilidade de uso em terrenos acidentados, a semeadura a lanço tem sido a mais adotada no estado.
Para ajustar a técnica à realidade da região amazônica, entre outros aspectos, a pesquisa avaliou a dosagem adequada de herbicida para dessecação do capim, o número de pulverizações necessárias, intervalo entre as aplicações do produto e melhor época para realização do processo. “O protocolo validado para os capins xaraés e piatã pode ser utilizado com todas as forrageiras disponíveis no mercado, de acordo com as orientações técnicas para cada variedade, com exceção da Brachiaria humidicola, devido ao alto custo das sementes e baixo vigor das plantas, característica que dificulta o estabelecimento dessa gramínea na pastagem, por semeadura a lanço”, destaca Andrade.
Potencial de usoA pecuária é a principal atividade econômica do Acre, com cerca de 24 mil produtores rurais e um rebanho bovino de 4,57 milhões de cabeças, distribuídas em 2,25 milhões de hectares de pastagens, conforme o Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo dados da Federação da Agricultura e Pecuária do Acre (Faeac), mais de 80% dos produtores que criam gado no estado são de base familiar, com rebanhos de até 100 cabeças e baixo padrão tecnológico. Essa realidade revela um vasto universo para uso do plantio direto a lanço. “A técnica pode ser utilizada em pequenas e médias propriedades, de forma simplificada com a pulverização manual na dessecação do capim. Em grandes empreendimentos rurais, esse processo pode ser otimizado com a pulverização aérea ou com auxílio de trator. O potencial de uso do plantio direto a lanço é imenso, mas, para a sua expansão na atividade pecuária, é essencial ampliar o acesso a linhas de créditos específicas e assistência técnica rural”, pondera o presidente da Faeac, Assuero Veronez. Um estudo realizado pela Embrapa, em 2022, por meio do Portfólio Amazônia, junto a representantes de diferentes segmentos produtivos da região, apontou que o principal desafio para a intensificação sustentável da pecuária na Amazônia Legal é a recuperação de pastagens degradadas. Segundo o pesquisador Judson Valentim, presidente do Portfólio, entre outros fatores, essa dificuldade está relacionada à baixa adoção de tecnologias, principalmente na produção familiar. “O plantio direto a lanço permite o aproveitamento de maquinários remanescentes do processo convencional de reforma de pastagem, como pulverizadores e semeadoras. Isso possibilita o uso da técnica em propriedades rurais com diferentes perfis socioeconômicos”, destaca. |