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  • janeiro 3, 2017

Pesquisa desenvolve embalagens anatômicas para frutas

Feitas de poliuretano e fibras vegetais, embalagens para frutas que acompanham o formato de seu conteúdo são capazes de evitar lesões de transporte e a consequente perda do produto (veja vídeo). Desenvolvidas em parceria de pesquisa entre diferentes instituições, as novas embalagens deverão estar disponíveis no mercado até o fim deste ano.

Segundo dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO/ONU), cerca de um terço da produção de alimentos no mundo é perdido na distribuição ou desperdiçado no consumo. Mais da metade dessas perdas e desperdícios ocorrem na manipulação, armazenamento e comercialização. O desenvolvimento de embalagens anatômicas para frutas foi uma das estratégias estudadas por uma equipe de 30 pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ), do Instituto Nacional de Tecnologia (INT) e Instituto de Macromoléculas (IMA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) para reduzir esses dados. As novas embalagens geram menor impacto mecânico, manutenção da qualidade sensorial e aumento da vida útil das frutas. A tecnologia genuinamente brasileira já rendeu 39 patentes obtidas no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e recebeu o prêmio Food Packing Design (2013) na Alemanha.
 
As embalagens foram projetadas para atender inicialmente algumas frutas. “Escolhemos produtos com significativo volume de venda nacional e internacional como manga e mamão, e também aqueles com importância econômica para o Estado do Rio de Janeiro, como caqui e morango”, informou Antonio Gomes, pesquisador da Embrapa e um dos líderes do projeto. Essas frutas de diferentes formatos e tamanhos passaram por escaneamento 3D (tridimensional) no Instituto Nacional de Tecnologia. A partir desse trabalho, foram desenhados e elaborados modelos físicos em poliuretano expandido adicionado de fibras vegetais, considerando os formatos e os vários tamanhos dos frutos, de modo a facilitar o transporte, manuseio e exposição. 
 
“Os modelos de embalagens permitem que esses frutos possam ser mais bem acomodados em bandejas, cujas cavidades foram especialmente desenhadas, o que reduz a ocorrência de injúrias mecânicas. Além disso, o design desse sistema de embalagens permite que ocorra maior ventilação dos frutos, promovendo a troca de gases com o ambiente, retardando seu amadurecimento e aumentando sua vida útil”, informa Gil Brito, da Divisão de Desenho Industrial do INT. As embalagens de manga e mamão, que são anatômicas, possuem duas partes: uma termoformada e outra termoinjetada articulada, que pode ser fechada para ocupar menos espaço durante o transporte de retorno para o produtor. O desenho das embalagens levou em consideração o padrão internacional de pallets para transporte de cargas nacional e internacional. Termoformada é uma peça moldada por ação do calor, a termoinjetada é confeccionada por injeção de resina líquida em alta temperatura em um molde.
 
Praticidade e proteção ao fruto
 
Agricultores familiares de Nova Friburgo, na região Serrana do Rio de Janeiro, testaram esse novo sistema de embalamento para o morango. “Essa embalagem é mais prática e higiênica, pois impede a entrada de insetos. Também protege mais o fruto, que é muito sensível”, afirma Dacir Condak, responsável pela Associação dos Agricultores Familiares de Produtores de Morango de Nova Friburgo (Amorango). Testes realizados com os vinte produtores da associação identificaram a necessidade de elevação da embalagem para abrigar os frutos maiores sem provocar amassamento, o que já foi incorporado ao produto. Enquanto essa nova embalagem adaptada não chega aos mercados, o produtor Dacir Condak, que há 35 anos cultiva a fruta, continua utilizando a embalagem aberta coberta com filme PVC. “Realmente, não é a mais adequada, mas é a que todos os produtores utilizam”, diz.
 
Da mesma forma, atualmente as caixas de madeira utilizadas nos Centros de Distribuição de Alimentos (Ceasa) e nas feiras livres são ainda amplamente utilizadas juntamente com as caixas de plástico retornáveis dos supermercados. “O problema é que as caixas utilizadas são as mesmas, independentemente do formato e tamanho do fruto, ocasionando grandes perdas e prejuízos econômicos para toda a cadeia produtiva, especialmente para o consumidor, que paga a mais pelo produto”, alerta Antonio Gomes, pesquisador da Embrapa.
 
Os estudos comprovaram que a utilização dessas novas embalagens anatômicas gera menor impacto mecânico (menos choques), melhor aspecto e aumento da durabilidade dos frutos. Segundo os pesquisadores, em mamão, as perdas pós-colheita observadas foram de apenas 2%, em vez de 25%, como normalmente ocorre. 
 
Quanto ao caqui, o resultado também foi significativo: “A nova embalagem estendeu a vida útil dos frutos de caqui entre quatro e seis dias em relação à caixa de madeira; e entre dois e três dias comparando-se à caixa de papelão. O estudo também apontou a preferência dos consumidores pelos frutos de caqui transportados na nova embalagem”, informa o pesquisador da Embrapa Marcos Fonseca que orientou e acompanhou o estudo da nova embalagem para transporte e comercialização de caqui, conduzido por Maristella Martineli, do Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos da UFRJ. 
 
Além de reduzir as perdas pós-colheita, as caixas anatômicas também geram eficiência ao trabalho de embalagem por acolher frutos de tamanhos variados. A classificação do produto por tamanho, cor e formato pode ser realizada diretamente pelo produtor no campo e ir direto para a comercialização. Se for para o “packing house” (casa de embalagens), o tempo dispendido no processo de embalamento das frutas é 50% menor com a nova tecnologia, segundo os pesquisadores. 
 
Essas embalagens também são ecologicamente corretas, utilizando como matéria-prima fibras naturais, que foram desenvolvidas no Núcleo de Excelência em Reciclagem e Desenvolvimento Sustentável (NERDES) do Instituto de Macromoléculas da UFRJ. A equipe do laboratório trabalha para o desenvolvimento de tecnologias que priorizem a economia de matéria-prima e de energia com menor impacto ambiental. 
 
“Para essas embalagens, desenvolvemos um compósito à base de polímeros e resíduos de fibras lignocelulósicas. Trata-se de tecnologia totalmente brasileira para atender uma demanda nacional, que é a minimização de perdas da agricultura. Além dessa justificativa ambiental, social e econômica, tem-se que parte do material utilizado para a confecção da embalagem é um resíduo; ou seja, iria para o lixo”, conta a professora Elen Pacheco, da UFRJ. 
 
Nanotecnologia biodegradável
 
Esse tipo de material conferiu maior degradabilidade (capacidade de se decompor na natureza) às embalagens e redução de impacto ambiental estimada entre 10% a 30%. E a equipe de pesquisadores busca mais: “Queremos desenvolver embalagens para outras frutas que não foram estudadas, como banana, uva e pêssego, e elaborar uma embalagem que seja produzida totalmente de resíduos”, conta Elen Pacheco. Assim, as pesquisas agora se voltam para a área de nanotecnologia, com a análise de nanocargas de fibras vegetais em compósitos, que poderão ser utilizados na construção civil, na fabricação de móveis, além da confecção dessas novas embalagens. 
 
Esse projeto de desenvolvimento de novas embalagens foi financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), envolvendo as três instituições públicas, com a participação da iniciativa privada na fase de validação industrial. Inicialmente, duas indústrias nacionais trabalharam na elaboração de protótipos validados pelo setor produtivo. E o custo? “Tentamos equacionar as necessidades de cada fruta, dentro de um sistema de embalagens que pudesse ser o mais padronizado possível. Observamos a realidade de produção, transporte e de comercialização nos mercados nacional e internacional, para que os custos de fabricação das embalagens fossem admissíveis pelos principais atores do processo”, contou Gil Brito, da Divisão de Desenho Industrial do Instituto Nacional de Tecnologia.

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